Marcelo José dos Santos tornou-se presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon) em janeiro de 2012, com propostas de estímulo à carreira do economista e ao fortalecimento dos cursos de Economia no estado. Santos analisa a contribuição dada pela instituição que preside à Economia baiana e opina sobre a conjuntura e as perspectivas do setor diante da crise internacional e seus impactos na Bahia e no Brasil. Confira a entevista abaixo!
C&P – Quando foi criado o Corecon-BA? Qual amissão da instituição e quantos economistas estão inscritos na Bahia?
Marcelo José – O Corecon-BA foi criado em 15 de maio de 1959, com a denominação de Conselho Regional de Economistas Profissionais (CREP), agregando à Bahia os estados de Sergipe e Alagoas. Sua missão é defender a sociedade, procurando sempre estabelecer um enfoque ético para a atuação dos profissionais em Economia, através da fiscalização do exercício da profissão. Conta, atualmente, com 5.041 economistas com registros ativos.
C&P – Qual a contribuição do Corecon-BA para o desenvolvimento da Economia baiana?
MJ – Inicialmente, a função primordial do Conselho constituía-se em fiscalizar o exercício da profissão. No entanto, não poderia ficar alheio à universalização das relações econômicas, perante os apelos e transformações do mundo atual. Diante disto, passou a participar dos grandes debates relacionados às políticas econômicas, promovendo eventos com a participação de profissionais de destaque nos cenários local e nacional, bem como, contribuindo para ampliar as discussões sobre temáticas econômicas, com a publicação anual do livro Reflexões de Economistas Baianos, já em sua oitava edição. Acrescente-se a participação dos economistas Alberto Valença, Fernando Pedrão, Lívio Wanderlei, Sérgio Gabrielli, além de inúmeros outros que prestam relevantes contribuições em órgãos ou instituições públicas e privadas ligadas ao planejamento e ao desenvolvimento do nosso estado.
C&P – Nos últimos anos vem ocorrendo uma redução da procura pelas vagas oferecidas pelos cursos de Economia no Brasil e na Bahia. Quais são as causas desse fenômeno?
MJ – Em primeiro lugar, temos uma legislação antiga que não assegura ao economista nichos de mercado, como ocorre em outras profissões. Existe um projeto de lei tramitando no Congresso Nacional que prevê algumas mudanças, no entanto, fazer tramitar um projeto de lei no Poder Legislativo não é tarefa das mais fáceis. Por outro lado, o Estado (nas suas três esferas) que era o grande empregador do economista, numa época em que o Brasil cometeu o equívoco de desprezar o planejamento como forma de gestão orçamentária, adotando políticas econômicas de curtíssimo prazo, abriu a outros profissionais a oportunidade de executar tarefas até então exclusivas do economista, deixando de exigir seu registro no Conselho profissional.
C&P – Na Bahia, boa parte dos cursos de Economia encontra-se em universidades estaduais localizadas no interior. Como fazer essa integração com o Corecon-BA?
MJ – A melhor forma de integrar as IES que se encontram no interior do estado é apoiar as iniciativas institucionais e se fazer presente nos eventos por elas promovidos. Isso já vem ocorrendo há algum tempo e foi intensificado recentemente, devendo prosseguir como uma estratégia que vem apresentando resultados promissores. Temos mantido contatos frequentes com a UESC e a UESB, localizadas no litoral sul e no sudoeste da Bahia, respectivamente. Para este ano, pretende-se estreitar as relações com a UEFS, situada no Portal do Sertão. Esses contatos nos possibilitarão estarmos mais próximos da academia, a grande responsável pela formação teórica e prática dos estudantes e futuros economistas, com o objetivo de atender às demandas, tanto do setor público quanto do setor privado. Vale ressaltar a pretensão de implantar o Corecon Acadêmico, em articulação com os centros acadêmicos das IES, constituindo-se em uma forma estimulante de integrar os estudantes de Economia ao Corecon-BA.
C&P – Analisando-se a conjuntura e as perspectivas econômicas para o Brasil e a Bahia. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que o processo de recuperação da Economia foi iniciado. O senhor concorda com essa visão, levando-se em consideração que o IBGE divulgou o crescimento de apenas 0,6% para o PIB no terceiro trimestre deste ano?
MJ – O Brasil tem suportado relativamente bem essa crise. As medidas tomadas, como a redução das taxas de juros, os incentivos fiscais, com a redução de IPI para o setor automobilístico e, mais recentemente, beneficiando a construção civil, visando à recuperação do setor industrial, de alguma forma têm atingido o objetivo. Com relação ao setor imobiliário, inicialmente acredito que houve um desvio de objetivo, levando a especulação para o mercado financeiro.
Entretanto, programas sociais, como Minha Casa, Minha Vida, por exemplo, estão sendo muito importantes, levando-se em consideração que há muito espaço para crescimento, pois o déficit habitacional ainda é muito grande.
C&P – Em 2012, a Bahia apresentou crescimento acima da média do Brasil. É possível manter esse desempenho nos próximos anos?
MJ – Acredito que sim. Há um esforço do governo no sentido de atrair novos investimentos, a exemplo do setor automobilístico, da redução na conta de energia, beneficiando diretamente o setor industrial, da implantação do parque eólico no semiárido, dos investimentos no sul do estado – Ferrovia Oeste-leste, Porto sul, Aeroporto de Ilhéus –, da presença dos jogos da Copa das Confederações e da Copa do Mundo, além da expectativa dos investimentos aqui em Salvador e Região Metropolitana. Isso nos leva a acreditar na manutenção dessas taxas de crescimento acima da média nacional.
C&P – Na avaliação do senhor, até que ponto a economia baiana será beneficiada com os estímulos dados ao setor, entre eles, a futura redução da conta de energia elétrica, que deverá cair para a indústria até 28%?
MJ – Como afirmei anteriormente, as medidas econômicas adotadas no país têm tido reflexos bastante animadores e, obviamente, têm causado impactos positivos na Bahia. No que se refere à questão da energia, aconteceu um avanço extraordinário no setor elétrico, no campo, o que deu oportunidade aos pequenos produtores, às comunidades indígenas, quilombolas e aos assentamentos de participarem de forma mais ativa na pequena e média produção agroindustrial. Acreditamos que, com a redução da tarifa, deverá haver uma atuação maior desse setor, assim como poderá se constituir em forte atrativo para a expansão da grande indústria, resultando em maior oportunidade de recuperação da economia baiana.
C&P – A indústria da Bahia ainda é extremamente concentrada espacialmente, principalmente na RMS. Investimentos como a FIOL, o parque eólico, o Porto Sul podem mudar essa realidade?
MJ – Essa é uma questão histórica. No entanto, já se podem observar mudanças fundamentais nesse processo. O agronegócio provocou o olhar para o oeste da Bahia, a crise na lavoura cacaueira começou a introduzir uma visão de cultura econômica a essa região, agora reforçada com o pacote de investimentos através da Ferrovia Oeste-leste, do Porto Sul, do aeroporto e, mais recentemente, os investimentos já confirmados na área (Petrobras/Bahiagás), com a assinatura da ordem de serviço para a construção da barragem do Rio Colônia, a implantação da Universidade Federal do Sul da Bahia, que beneficiará também o extremo sul. Outros projetos ainda podem ser implantados, com forte repercussão e desdobramentos econômicos e sociais, como, por exemplo, a Região Metropolitana de Ilhéus e Itabuna. Tudo isso levantará outras demandas, porém, o mais importante é que está acontecendo com planejamento estratégico de médio e longo prazos. Essa é a questão mais importante, e é claro que vai precisar de tempo e persistência e revela uma concepção de estado.
C&P – Quais os impactos das obras de infraestrutura para a Copa do Mundo de 2014 para a economia baiana e a população?
MJ – O impacto principal está na arrecadação de impostos, uma vez que, com o aumento do fluxo de pessoas, haverá uma movimentação nos vários setores da economia, com ganhos para o segmento prestador de serviços, como na área hoteleira, cultural, de alimentação, de lazer, entre outros. Agora, há que se levar em conta que, após oito anos desastrosos da gestão municipal de Salvador, é urgentíssimo que os gestores municipal e estadual sentem-se à mesa – esse passo já foi dado em mais de uma oportunidade – e priorizem as ações, envolvendo todas as instituições que, de alguma forma, já atuam na área – Sesc, Senai, Senac, Sebrae.
Todos sabem que, apesar das ações já executadas, há muito por executar na educação, no treinamento das pessoas que vão lidar com o público, como taxistas, garçons, guias de turismo, entre outros. Por sua vez, tornam-se imprescindíveis a aceleração das obras de ampliação da capacidade de atendimento do aeroporto, a recuperação das vias e equipamentos urbanos e da área portuária, assim como a checagem de vagas no sistema hoteleiro. Ações impactantes precisam ser realizadas na malha viária, considerando que não adianta o estádio ficar pronto e a mobilidade urbana não acontecer. Outro aspecto fundamental a ser observado é o setor de saúde, visto que a Bahia irá receber um grande fluxo de visitantes e deve estar preparada para prestar um serviço de qualidade.
C&P – A economia mundial passa por um momento de grandes dificuldades, seja nos Estados Unidos, onde o crescimento tem sido modesto, seja na Zona do Euro, que está em recessão técnica. Diante desse quadro, em sua opinião, quais as perspectivas para a economia mundial nos próximos anos?
MJ – O quadro atual apresenta uma receita que, em outros tempos, o FMI impôs como modelo para se alcançar o equilíbrio: corte de gastos correntes e de investimentos, acrescentando ainda uma crise fiscal. Junte-se a isso a quebra do sistema bancário, consumindo recursos que deveriam estar sendo alocados nos investimentos público e privado. Note-se que mesmo a Alemanha, que estava numa situação relativamente confortável no início, praticamente parou de crescer e está em recessão técnica. Sinceramente, não acredito que, no curto prazo, se consiga resolver esse problema; por outro lado, como se trata de países com tradição de enfrentamento de crises cíclicas e demonstraram capacidade de superação, em médio prazo é possível vislumbrar alternativas consistentes para resolver a questão.
C&P – Como essa conjuntura internacional adversa pode afetar o Brasil e a Bahia em 2013?
MJ – O quadro da economia mundial ainda deverá se manter instável por algum tempo, tornando-se importante, portanto, não criarmos expectativas exageradas, pois ainda há muito que fazer. Historicamente, o Brasil se manteve como uma economia fechada em relação ao restante do mundo, na medida em que sempre se utilizou de políticas protecionistas – controle das contas públicas, taxa de câmbio, controle rígido da inflação e foco na acumulação de reservas cambiais para fazer face ao endividamento externo.
Em função dos fatores que desencadearam o processo da crise mundial e de o Brasil assumir um comportamento diferente na adoção de políticas econômicas, o país tem conseguido superar as dificuldades, e, nesta última década, atravessar a marola da crise. Mas as adversidades da conjuntura econômica internacional ainda vão se prolongar, e isso tem que colocar o Brasil em alerta. No entanto, outro aspecto a ser considerado é que os “olhos” do mundo estão voltados para o Brasil. Apesar de apresentarmos os menores índices de variação positiva do PIB em relação à maioria dos países latino-americanos, possuímos um mercado consumidor interno com perspectiva de crescimento, em virtude do aumento do poder aquisitivo da população.
Referindo-se à Bahia, acredito que a grande massa de investimentos, principalmente em relação aos recursos do PAC, associados às PPP nos territórios de identidade, proporcionarão o surgimento de novos projetos, com a criação de postos de trabalho e, consequentemente, ampliando ainda mais o poder aquisitivo, elevando, assim, o crescimento do mercado.